quinta-feira, 20 de abril de 2017

'Se aconteceu comigo, pode acontecer com outras'

"Você vai confiar numa pessoa que é o seu ginecologista. [...] Você Imagina fazer o exame normal, de gravidez. Mas não passar por isso, do médico te apalpar". O desabafo é de uma mulher que, na 38ª semana de gestação, acionou a polícia para denunciar o abuso sexual do próprio médico durante o pré-natal. "Se aconteceu comigo, pode acontecer com outras", relata.

O caso está sendo investigado pela Delegacia de Defesa da Mulher de Mogi Guaçu (SP). A auxiliar de produção, de 27 anos, não quis ser identificada pela reportagem. Ela já tem uma filha de 7 anos e, nesta quinta-feira (20), completa 40 semanas de gestação de um menino.

A mulher acusa o médico ginecologista e obstetra de ter tocado o clitóris dela durante um exame de toque e de a ter apalpado em duas consultas.

“Eu queria muito que ele pagasse pelo que ele fez. [...] Hoje é minha palavra contra a dele, porque não tinha ninguém, só eu e ele dentro da sala. Dinheiro não quero dele. Quero meus direitos. Com ele nunca mais eu quero passar [em consulta]. E queria que ele não exercesse mais [a medicina]”, afirma a gestante.

A defesa do médico Mário Augusto Fuzetti Bueno, que atua na rede pública de saúde da cidade, informou que ele não vai se manifestar sobre a denúncia e que aguarda o desfecho da ocorrência. A Prefeitura e o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) instauraram sindicância para apurar a denúncia.

'Malicioso'

Em entrevista ao G1, a jovem contou que passou pelas situações nas duas últimas consultas que teve com o profissional. Na última, ela saiu em prantos, contou o ocorrido para uma enfermeira e registrou uma reclamação na ouvidoria da Prefeitura. Ela também fez um boletim de ocorrência. O inquérito policial já foi instaurado e apura se houve "violação sexual mediante fraude".

No dia 30 de março, na Unidade Básica de Saúde (UBS) da Zona Norte da cidade, onde faz o acompanhamento do pré-natal, a gestante estranhou o comportamento do médico ao fazer o exame de toque. À polícia, ela contou que o obstetra tocou seu clitóris.

Diferentemente de outras vezes, não havia uma enfermeira acompanhando o exame. Em seguida, o médico perguntou sobre a ocorrência de estrias e pediu para vê-la de perto.

“Fiquei de pé em frente a ele. Ele começou a examinar e apalpar o bumbum pra ver se tinha celulite. Eu fiquei meio constrangida. Nunca tinha acontecido isso. Peguei, saí e vim embora".

Tirou a roupa

No dia 6 de abril ela retornou à UBS para mais uma consulta do pré-natal. Após ouvir o coração do bebê, a mulher conta que o obstetra mediu a barriga dela com uma fita métrica e quis verificar uma irritação vaginal, mesmo após ela dizer que estava tudo bem.

A jovem conta que estranhou quando, em vez de abaixar, ele tirou a calça dela no consultório. Além disso ficou incomodada com o comentário que ele fez, segundo ela.

"Ele mesmo tirou a legging. Eu já achei estranho porque o certo era eu me vestir, me trocar dentro do banheiro. Já fiquei meio apreensiva. Ele fez um comentário que achei muito chato: ‘Tá inchada, mas tá bonitinha’. Falou desse jeito pra mim", afirma.

A consulta já chegava ao fim quando o médico perguntou se ela tinha mais alguma reclamação e a gestante falou sobre dor nas costas. Ao se aproximar, o médico disse que ela possuía um desvio e voltou a perguntar sobre celulites e estrias. Foi nesse momento, segundo a mulher, que o pior aconteceu.

"Ele abaixou minha legging até o joelho, fiquei de calcinha e ele novamente apalpou meu bumbum. Ele apertou meu bumbum, ele começou a acariciar, levantou e disse: ‘deixa eu medir sua barriga’".

Ele já tinha feito a medida com uma fita métrica no início da consulta. Desta vez, a grávida conta que ele usou as mãos.

"Me abraçou, envolveu a mão na minha barriga. Começou a me juntar, junto dele, e começou a me trazer bem perto dele, fungar no meu pescoço, começou a se esfregar em mim. Fiquei constrangida. Vontade de sair do lugar, mas não tinha como sair. Senti quando ele ficou excitado", lembra.

Antes de deixar o consultório, ela disse que ele perguntou: “Parece que te deixei constrangida?" Ela respondeu: "Deixou sim”.

Último dia do médico

A jovem saiu da consulta aos prantos e procurou uma enfermeira da UBS. Segundo a grávida, a enfermeira perguntou “Foi o Dr. Mário, né?”. E a gestante disse que sim, que era a segunda vez que ele a estava assediando.

A paciente contou ao G1 que sabia que o obstetra tinha uma fama de ser mais "seco" no relacionamento com as pacientes. Ao detalhar o ocorrido para a enfermeira, ela ficou impressionada e disse à gestante, segundo ela, que ele não a atenderia mais pois aquele seria o último dia dele na unidade.

O G1 entrou em contato com a UBS e funcionários informaram que, antes da denúncia ser feita, a saída do ginecologista estava certa e que ele assumiria um outro cargo.

A Prefeitura não confirmou oficialmente essa informação. Disse apenas, por nota, que instaurou um processo de sindicância e procedimentos apuratórios, que transcorrerão sob sigilo.

Portal G1