terça-feira, 28 de março de 2017

Paralisadas, obras de creches em Jaboatão são retrato do abandono

O município de Jaboatão dos Guararapes tem pelo menos quatro creches que já deveriam estar prontas, mas as obras foram paralisadas há quase seis meses. As unidades de ensino integral, que deveriam beneficiar centenas de crianças de áreas carentes, hoje são retrato do abandono. A TV Globo esteve em três delas e não encontrou nenhum trabalho nos locais. Apenas materiais jogados, estruturas se deteriorando, mato alto e focos de criação e reprodução do mosquito Aedes aegypti.

As creches estavam sendo erguidas pela empresa MVC, que trabalha com pré-moldados de plástico e PVC. De acordo com as placas afixadas nos canteiros, as obras começaram entre março e abril. Deveriam estar concluídas em outubro e novembro. Mas foram interrompidas perto do período das eleições municipais e não foram retomadas.

A creche fincada no terreno doado pela comunidade Obra de Maria, entre Jardim Monte Verde e Dois Carneiros, simboliza o abandono. Logo na frente, pedra e areia amontoados revelam que a obra parou. No alojamento próximo, é possível ver capacetes, tubos de cola plástica, saco de cimento aberto. “Parou entre outubro e novembro. E até então está assim. Algumas pessoas estão levando areia, brita, tijolo, telhado”, conta o missionário Alisson Dantas, que mora na comunidade Obra de Maria.

A Obra de Maria mantém uma creche para atender crianças da comunidade, mas sobrevive apenas com doações. Sem dinheiro, a unidade está abrindo apenas no turno da manhã. “Minha filha já não está trabalhando, porque não tem com quem deixar as crianças. Seria muito bom se a prefeitura terminasse essa obra aí”, diz a dona de casa Maria Eusébio, que tem dois netos pequenos.

Dentro da creche municipal inacabada, paredes erguidas carecem de acabamento. As partes elétrica e hidráulica da unidade não foram feitas. Algumas folhas de plástico que forram as paredes começam a descolar. O mato cresce e, nos fundos do prédio, quase atinge a altura do teto. Uma construção orçada em quase R$ 1,4 milhão, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), do governo federal, que vai se deteriorando pela falta de manutenção.

Na creche BR-101, no bairro da Muribeca, a situação é ainda pior. O investimento da mesma ordem, também do FNDE, hoje apresenta um cenário desolador. Bem na frente do prédio, dezenas de materiais e estruturas abandonadas em meio ao mato. Até uma pia nova está jogada nos entulhos. No lugar do muro, somente as pilastras foram erguidas. Não há nenhum vigilante no local.

A vegetação entra pelas salas. No pátio, cadeiras vazias, talheres, garrafas, vassouras, sinal de que um dia houve gente ali. A reportagem encontrou pelo menos três focos de dengue, incluindo uma verdadeira piscina cheia de água parada. Ambiente propício para criação e reprodução do Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, zika e chikungunya. Várias estruturas estão quebradas. Parte do teto ameaça cair. Paredes feitas de isopor coberto com placas de PVC se partiram e apresentam buracos gigantes.

Esse modelo de construção tem sido alvo de investigação por parte do Tribunal de Contas da União (TCU). De acordo com levantamento feito em todo o Brasil pelo TCU, eram 800 obras de creches paralisadas no país. O tribunal realizou auditoria em 45 unidades e verificou que 70% apresentavam “atrasos expressivos”. Além disso, de 39 obras concluídas, 85% tinham “deficiência de qualidade”.

A reportagem procurou o ex-prefeito Elias Gomes. Em nota, ele afirmou que a MVC concluiu duas obras em Jaboatão e que outras quatro foram interrompidas em novembro, com uma média 70% da execução. “A empresa com dificuldades financeiras não mais apresentava as certidões exigidas para pagamentos”, diz a nota, acrescentando que não faltou dinheiro para as obras. Segundo ele, há outros contratos com a MVC para obras de creches que ainda não foram iniciadas.

O Ministério da Educação (MEC) foi procurado para falar sobre repasse de recursos e qualidade das edificações, mas ainda não houve resposta. A MVC também não atendeu as ligações. A gestão atual da Prefeitura de Jaboatão afirmou que está trabalhando para que as obras sejam retomadas, mas destacou que uma nova licitação precisa ser feita.

Portal G1