sexta-feira, 22 de junho de 2012

Abílio Diniz deixa Pão de Açúcar depois de 50 anos


Na sede do Grupo Pão de Açúcar, na Av. Brigadeiro Luís Antônio, nº.3142, Abílio Diniz realizou um breve discurso durante a reunião do conselho administrativo da empresa. A assembleia geral extraordinária do grupo começou às 14h e terminou pouco antes das 15h. Na parte inicial, houve a leitura da ordem do dia e a renúncia de dois conselheiros da cota de Abilio, seus dois filhos, João Paulo e Ana Maria Diniz.
Em seguida, foram aprovados por unanimidade os nomes de três novos membros do conselho de administração, todos indicados pelo Casino – Roberto de Oliveira Lima, Eleazar de Carvalho Filho e Luiz Augusto de Castro Neves. A indicação dos executivos faz parte do processo de reestruturação no controle da companhia, previsto no Acordo de Acionistas assinado há seis anos por Abilio Diniz e Jean-Charles Naouri, presidente do Casino.
Depois disso, foi cedido tempo aos acionistas para que se pronunciassem, mas ninguém se manifestou. Abilio, então, fez um breve discurso em que agradeceu o carinho de amigos e colaboradores. Disse que estava bem e preparado para seguir adiante, ressaltou a importância da data, pois estava passando para frente o controle do grupo que fundou com seu pai, Valetim Diniz, quando terminou a faculdade na década de 40. “Estou sentido, mas aqui não é o lugar para pedir apoio, compreensão, amizade e amparo. Agora não é hora de desabafos. É um momento de transição, momento no qual é importante apontar rumos e reafirmar valores", disse.
O empresário também afirmou que em nenhum momento pensou em quebrar o contrato com o Casino. Em um retrospecto da trajetória do grupo, lembrou que desde a abertura de capital em 1995, o Pão de Açúcar aumentou seu valor de mercado em 30 vezes. Abílio também comentou que em 1999, quando se associou ao Casino, dizia-se que o grupo estava mal, mas tratava-se apenas de um problema de caixa. E que, a partir de então, compreendeu a importância do caixa e acredita que devido a essa nova postura, o grupo não teve muitas dificuldades durante a crise de 2008, conseguindo comprar o Ponto Frio e as Casas Bahia, em 2009.
No discurso, Abilio também mencionou a importância do endereço em que a assembleia acontecia. Foi nesse local que o pai do empresário fundou a confeitaria que deu origem à companhia e também onde sua filha, Ana Maria Diniz, nasceu. “Em muitos momentos escrevíamos ideias nas paredes”, disse.
Para o empresário, o sucesso empresarial atingido pelo grupo só foi possível porque "jogaram limpo e acreditaram no bem". Ele acredita que o novo acordo firmado com Casino em 2006 foi a coisa certa a se fazer, porque proporcionou liquidez às ações de seu pai, que pôde em vida distribuí-las a seus filhos. De acordo com Abilio, o acordo permitia que trabalhasse até quando quisesse no grupo, e ele afirma que continuará sendo o presidente do conselho para colaborar com o crescimento da companhia.
O Pão de Açúcar se associou ao Casino em 1999, mas só sete anos depois o grupo francês realizou um novo aporte na companhia e se tornando um dos principais acionistas. Na ocasião, foi criada a holding Wilkes, para Abilio Diniz e Casino controlarem de forma compartilhada o Pão de Açúcar. Agora, Abilio Diniz se tornará o segundo maior acionista do grupo e o presidente vitalício do conselho de administração do GPA. Ele pode permanecer nesse cargo enquanto estiver bem de saúde para desempenhar as funções da presidência.
Abilio ainda pediu que o Casino conservasse "a humanidade, a gentileza, o respeito e o cuidado" por todos os funcionários do Pão de Açúcar. E disse que as pessoas não deveriam encarar o evento como uma despedida, porque existem três coisas das quais não gosta: “cebola, despertador e despedidas”. Foi encerrada a sessão e Abílio foi aplaudido em pé pelos presentes (leia ao final o discurso na íntegra).
Os três novos conselheiros
Em um comunicado divulgado no website do Casino, no começo deste mês, a rede francesa destacava que Carvalho Filho é um executivo altamente qualificado e sócio-fundador da Virtus BR Partners. A nota acrescentava que ele já foi executivo-chefe do Unibanco Investment Bank e do UBS Brasil, além de ter passado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Já Castro Neves é descrito como diplomata com longa carreira no Ministério de Relações Exteriores. Ele foi embaixador do Brasil na China, entre 2004 e 2008, e também no Japão, de 2008 a 2010. Também foi presidente do conselho da Itaipu Binacional. Atualmente, é presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). Roberto Lima já foi executivo-chefe da Vivo e da Credicard, além de ter passagens pela Accor e outros grupos. Atualmente é membro dos conselhos da Natura, Telefônica Brasil, Rodobens e Edenred.
Fim de uma era - Pela primeira em seis décadas, as vontades, a visão, as estratégias e os desejos de Abilio Diniz terão menos peso no Pão de Açúcar, o maior grupo varejista do País, a partir desta sexta. Por meio de um complexo acordo acionário com o grupo francês Casino, Diniz deixará de dar as cartas na empresa criada por seu pai ainda na década de 1940 e a qual dedicou toda sua vida adulta. A princípio, a partir das 14 horas desta sexta, quem manda prender e quem manda soltar no império que faturou quase R$ 20 bilhões no ano passado é um francês baixinho, de origem argelina e que atende pelo nome de Jean-Charles Naouri.
É ele quem, às nove horas da manha dessa sexta-feira, deve assumir a presidência do Conselho de Administração da Wilkes, a holding que, de fato, dá as cartas em todo o grupo Pão de Açúcar. Ela foi criada em 2005, quando o varejista francês Casino, do qual Naouri também é presidente do Conselho, pagou US$ 900 milhões a Abilio para comprar uma fatia ainda maior do grupo varejista brasileiro – o primeiro aporte havia sido feito em 1999. Pelo acordo assinado há sete anos, a partir desta sexta Abilio tem até dois meses para vender um lote de um milhão de ações da Wilkes para o Casino. Se resistir em fazê-lo, o Casino tem o direito de comprar uma única ação, pelo preço simbólico de R$ 1,00 e, assim, se tornar o controlador da holding.
Com a nova configuração, Abilio até permanece na presidência do Conselho de Administração da Companhia Brasileira de Distribuição, a empresa que controla todos os negócios do grupo, desde os supermercados Pão de Açúcar até as operações na internet no Ponto Frio, por exemplo. Mas a composição desse Conselho muda radicalmente. Até esta quinta, Abilio tinha cinco assentos, ocupados por ele, seus três filhos e sua esposa, Geyze Marchesi Diniz. Outros cinco postos eram ocupados por integrantes do Casino, além de quatro conselheiros independentes.
Agora, Abilio terá direito a ter apenas três assentos no Conselho, enquanto o Casino passará para oito, com um conselheiro a mais do que existe hoje. No futuro, o Casino pode indicar ainda mais três e chegar a 11 conselheiros ou 18 no total. Quatro integrantes continuarão independentes, mas mesmo que decidam unir-se a Abilio, os Diniz sempre estarão em desvantagem. Como Naouri mal lhe dirige a palavra desde que, na visão do empresário francês, tentou evitar o que deve acontecer nesta sexta arquitetando uma fusão com o Carrefour – um dos principais competidores do Casino na França –, a tendência é que Abilio Diniz se transforme em um de seus maiores pesadelos: uma rainha da Inglaterra. Terá a pompa, como presidente do Conselho, mas não terá o poder. Para Abilio, no entanto, a união com o Carrefour era mais um movimento no sentido de continuar expandindo as operações do grupo.
De todo modo, será uma nova fase em sua vida e ninguém – talvez nem ele – sabe ao certo quais serão seus próximos passos. Há vários caminhos que podem ser seguidos. Sua participação no grupo – de cerca de pouco mais de 20% das ações – pode lhe render mais de R$ 2 bilhões se vendidas. Há quem diga que ele tentará negociar uma saída em direção a uma das controladas do Grupo, como a Via Varejo, junto ao Casino. Ele pode, até mesmo, continuar como presidente do Conselho de Administração de forma vitalícia. Esta última, a menos provável, levando em conta a história desse que é um dos mais controversos e agressivos empresários brasileiros da segunda metade do século 20.
Para transformar o Pão de Açúcar no gigante que faturou mais de R$ 56 bilhões no ano passado, Abilio Diniz não mediu esforços. Quando jovem, abandonou o sonho de uma carreira acadêmica nos Estados Unidos para abrir, com o pai, o primeiro supermercado da família, no fim dos anos 50. Nos anos 80, comprou briga com o governo José Sarney - foi acusado de conspirar contra o Plano Cruzado ao estocar quase 4 milhões de latas de óleo no auge do desabastecimento – e, como ele mesmo diz, tornou-se o “inimigo número um do Brasil". Para assumir as rédeas do grupo, que por pouco não foi à bancarrota no início dos anos 90, entrou em uma disputa fraticida com os irmãos pelo controle da empresa. Por conta dessa briga, que o tornou o dono de fato da empresa, ficou anos sem trocar palavras com a mãe.
“A tarde da briga em que se selou o rompimento da família foi um dos meus piores momentos. Aquilo me fez questionar seriamente algumas das atitudes que tomei ao longo da vida: havia trabalhado duro para construir o Pão de Açúcar. Nunca parei para pensar na fragilidade de minha situação dentro da empresa", escreveu ele em seu livro "Caminhos e Escolhas – O Equilíbrio para uma Vida mais Feliz", misto de biografia e auto-ajuda que lançou em 2004, um ano antes de selar seu destino com o Casino.
Figura polêmica na década de 80, quando conseguiu que um de seus mais próximos colaboradores, Luiz Carlos Bresser-Pereira, se tornasse o substituto de Dilson Funaro – a quem tanto criticara – no Ministério da Fazenda, Abilio encerrou aquela década com um trauma. Foi sequestrado, às vésperas das primeiras eleições presidenciais diretas desde o Golpe Militar de 1964, por um grupo de guerrilheiros. Seus algozes, ao serem capturados, foram vestidos com camisas do PT e de apoio a Lula, que disputava a Presidência com Fernando Collor de Mello.
A partir dessa experiência Abílio passou por uma transformação profunda. De empresário com imagem de ganancioso passou a cultivar outra, a de um empreendedor inovador, um líder focado em resultados e um absoluto obcecado pela forma física. Em pouco mais de 10 anos, tirou o Pão de Açúcar de uma situação pré-falimentar para a liderança inconteste do varejo brasileiro, título conquistado em 2001, dois anos após o início da parceria com o Casino. Ganhou, assim, uma vaga no panteão dos maiores empresários da história do país.
Ao longo da última década expandiu de forma vigorosa o negócio criado por seu pai. Viu o valor de mercado da companhia sair dos R$ 5,5 bilhões para mais de R$ 23 bilhões – valor atingido em maio desse ano. Hoje são quase 150 mil empregados espalhados pelo País. Mas, ao cabo desse impressionante crescimento, acabou perdendo o controle sobre o império que criou. Ninguém ousa arriscar qual será o próximo passo de Abilio. Mas ao menos em um ponto não há divergência: não há quem acredite que ele ficará parado.
Portal IG